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Crônica de uma 'jornaleira': Afinal, quem sou eu na fila do pão?

Correria rotineira de uma sexta-feira a tarde numa rodoviária. Pessoas que chegam, outras que se vão. E eu estava indo de volta à minha tão amada e odiada Ibaté. Comprei a passagem, aguardei pelo ônibus, embarquei e viajei. Cheguei à rodoviária de São Carlos, encontrei com meu pai, fomos para minha cidade e, em poucos minutos, lá estava eu: de volta à pacata cidade onde nada acontece. Onde sinto que o tempo parou exatamente do jeito que deixei da última vez em que ali estive.
Descrições à parte, estava eu no supermercado na fila do pão esperando a minha vez – pacientemente e vendo coisas da vida alheia nas redes sociais – quando ouço uma conversa mais ou menos assim:
 - Mas você viu que o prefeito mandou matar todos os escorpiões daquele bairro lá de baixo?
 - Nossa! Eu vi! Esse prefeito é bom mesmo, hein? 
 - E como! Mandar matar os escorpiões, quem diria. Ele está de parabéns! 
Não me contive e interrompi a conversa, num ímpeto: 
 - Com licença, senhoras. Por que as senhoras estão parabenizando o nosso prefeito?
A primeira respondeu-me que era pelo caso dos escorpiões e explicou ainda que havia alguns meses que eles estavam aparecendo nas casas do tal bairro e ninguém tomava providências. Então, o "super-prefeito" foi lá e limpou terrenos particulares. Então fiz uma ressalva:
- Não foi o departamento de serviços públicos que realizou a limpeza? E, sendo um caso tão grave assim, não era uma obrigação da prefeitura notificar os donos de tais terrenos primeiro?
Então, ela respondeu-me:
- Não sei se foi o departamento. Mas que o prefeito mandou, ele mandou. E outra, limpou terrenos particulares. Nem era obrigação deles! E você já viu o que ele fez na nossa cidade?
- Sim, eu vi. Ele mudou muita coisa em oito anos de mandato. Mas, eu acredito que tudo tem um limite e que outras pessoas também devem ter a chance de mostrar do que são capazes. Devemos dar chances para candidatos novos e diferentes.
A segunda mulher, que nem estava participando da conversa olhou para mim com uma cara enfurecida e disse-me:
- Ih, aposto que você votou no outro, né? Sabia que não gosta do nosso prefeito!
Tentei explicar-me:
- Não votei em nenhum, na verdade, porque não tínhamos opções boas nas últimas eleições. E nas anteriores não votei nem nele nem no outro, votei num candidato menor e em quem eu confiava. Mas, a questão não é o candidato em si, são as propostas...
- Fia, escuta uma coisa. Esse homem fez muito por Ibaté e enquanto ele se candidatar eu vou continuar votando nele. E se ele indicar um poste, eu voto no poste, mas não voto em outro. Por que eu confio demais nele e em quem apoia ele.
Vendo que não tinha mais jeito e que eu era a próxima da fila, apenas sorri e disse:
- Sabe de uma coisa? A senhora está coberta de razão! Tenha uma boa tarde!

Sorri, virei para a moça da padaria, peguei meu pão e saí. Afinal, quem sou eu na fila ibateense do pão? 

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